Neste mês se comemoram os 50 anos do Tratado de Não Proliferação Nuclear. Sem avanços na área de desarmamento, quais as perspectivas para a sobrevivência deste tratado após 2020?
Em março de 1970 foi ratificado o Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), considerado a base para a manutenção da segurança internacional e para impedir uma corrida armamentista nuclear mundial.
“A ratificação do TNP é um dos eventos mais relevantes do século XX em matéria de segurança internacional”, afirmou o vice-diretor do Departamento de Não Proliferação e controle de armamentos do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Oleg Rozhkov.
De fato, o tratado foi bem-sucedido ao frear a proliferação de armas nucleares. A especialista Daria Selezneva lembra que “em 1961 o presidente Kennedy fez um prognóstico de que, na década de 70”, até “25 países poderiam obter armas nucleares”. Hoje, somente sete países confirmam a posse de arsenais nucleares.
O TNP, que conta com a adesão de 189 países, é considerado o acordo mais universal da história e, por isso, “um dos elementos centrais da ordem mundial”, notou Rozhkov.
Divergências em torno do TNP
De acordo com o tratado, os cinco países legalmente nucleares – EUA, Rússia, China, França e Reino Unido – se comprometem a tomar medidas para se desfazer dos seus arsenais. No entanto, nenhuma medida neste sentido foi tomada nos últimos cinquenta anos.
“Os Estados não nucleares acreditam que o processo de desarmamento avança de maneira demasiado lenta”, disse Selezneva à Sputnik Brasil.
Para a especialista, essa insatisfação foi um dos principais motores que levaram os Estados não nucleares, inclusive o Brasil, a assinarem o Tratado pela Proibição de Armas Nucleares, em 2017.
Outra demanda dos Estados não nucleares é a garantia ao acesso aos usos pacíficos da energia nuclear, que pode ser utilizada para fins medicinais, de pesquisa e de geração de energia elétrica.
“O acesso à energia nuclear é considerado um direito inalienável dos países não nucleares. Os países não nucleares têm interesse no acesso e os nucleares tem interesse em fornecer essas tecnologias”, disse Selezneva.
Novas ameaças ao TNP
Para Oleg Rozhkov, o TNP enfrenta novos desafios no século XXI: “Existem algumas ameaças que não poderíamos ter antecipado na época da assinatura do tratado, como a do terrorismo nuclear.”
Selezneva não para por aí e aponta o desenvolvimento de novas tecnologias, como “inteligência artificial, armas cibernéticas e novos tipos de armamentos”, como desafios fundamentais à sobrevivência do TNP.
A especialista lamenta que alguns termos-chave do tratado, como o de “armas nucleares”, não tenham sido definidos de forma clara na ocasião da sua assinatura.
“Essa ausência faz com que tenhamos desacordos sobre a possibilidade de estacionar armas atômicas em países não nucleares, como fazem os EUA no território de alguns países europeus.”
A ausência de definição clara tem “consequências duradouras” e permite “a participação de alguns países da OTAN em exercícios militares que incluem bombardeiros com capacidade nuclear”, lamentou Seleznova.
Espaço para consensos
Neste ano deve ser realizada mais uma Conferência de Revisão do TNP. Apesar das grandes divergências existentes entre países nucleares e não nucleares, existem alguns pontos de consenso.
“Todos os países membros concordam em alguns temas regionais do regime de não proliferação, como por exemplo a questão do Irã e da Coreia do Norte”, lembrou Selezneva.
Para ela, existe amplo consenso de que “os países que estão fora do TNP devem entrar, de que o TNP deve ser universal”.
Em alguns casos mais complexos, como os da Índia e Paquistão, que possuem armas nucleares e não são signatários do TNP, Seleznova acredita que tanto países nucleares como não nucleares “querem que esses países se desarmem e assinem o acordo”.
Mas a especialista lembra que os objetivos colocados perante os países membros devem ser realistas, lembrando que “o TNP é um acordo político, e a política é a arte do possível, em primeiro lugar”.
Especialistas e membros do governo russo se reuniram nesta quinta-feira (12), em simpósio organizado pelo instituto de pesquisa PIR Center, para debater as perspectivas do Tratado de Não Proliferação de armas nucleares.